A Globalização da Complexidade (vi): O posicionamento da Cultura na Hipermodernidade

A Globalização da Complexidade (vi): O posicionamento da Cultura na Hipermodernidade

30/04/2019 0 Por hernani

Baseado na obra de Mike Featherstone, 

“A Globalização da Complexidade” (vi)

O posicionamento da Cultura na Hipermodernidade

A cultura assusta muito.
É uma coisa apavorante para os ditadores.
Um povo que lê nunca será um povo de escravos.

António Lobo Antunes, in Diário de Notícias (2003)

Como podemos definir CULTURA? Existe uma riqueza de sentidos diferentes para o termo cultura. Kroeber e Kluckhohn encontraram pelo menos 167 definições. Embora a Grécia Antiga não nos tivesse deixado a palavra «cultura», esse conceito existia entre si com o termo «paidéia»; segundo Jaeger, o processo de «educação» na sua forma verdadeira, na sua forma mais natural e genuinamente humana. O conceito «paidéia» chegou a Roma como «colere», cultivar. Para Tylor, cultura é “aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade”. Para Weber, Cultura é uma experiência consciente do indivíduo, um campo em que o homem se define, fundamentalmente, como ser criador de sentidos ou intérprete da sua existência. Para Geertz, Cultura é como um sistema simbólico organizado por um código de símbolos partilhados pelos membros de uma organização social; e que o homem é em simultâneo o produtor e o produto desta cultura. “Estaline, como todos os comunistas, insistia em que a cultura não se limitasse aos poemas de Pushkin, mas abrangia a literacia, a higiene, a casa, a comida, a consciência moral e a eficiência”. (SERVICE, 2004 p. 308). Por o termo estar associado ao conceito de civilização, enumeras vezes ele confunde-se com concepções de etiqueta, desenvolvimento, educação e comportamentos elitistas; por isso a existência da dicotomia entre «cultura erudita» e «cultura popular». Segundo Featherstone, “a cultura aparece sob a forma de normas e valores que constituem o cimento social indispensável para manter a sociedade unida diante das ameaças de destruição trazidas pela industrialização, pelo capitalismo e pela modernização” (FEATHERSTONE, 1996). Mais económica em conceitos a afirmação de Ruth Benedict, para quem a “cultura é formada por muitos detalhes que compõem um padrão coerente”. Mais concisa ainda a visão semiótica de Berta Campos, quando diz que “cultura é a partilha de significado”.
Featherstone acredita que “a modernidade expressa uma ordenação e coerência, num projecto universalizante que não existe mais no tempo em que vivemos”. Por isso “a cultura pósmoderna transmite uma sensação de perturbação e fragmentação cultural, decorrente de um descentramento desta cultura em relação ao que era na modernidade”. E que “esse processo de fragmentação e colapso cultural das hierarquias simbólicas tem a sua origem mais na consciência de uma modificação do valor do poder simbólico e do capital cultural do Ocidente, do que na passagem para uma nova etapa da história, que seria a “pós-modernidade” (FEATHERSTONE, 1996).
A fragmentação cultural levanta algumas reflexões: “Ao mundo de ontem em que a cultura era um sistema de signos distintivos, comandados pelas lutas simbólicas entre grupos sociais, que se organizavam em torno de pontos de referência sagrados e institucionais, sucede o mundo da economia política da cultura e da produção cultural prolífera e incessantemente renovada. (…) Nestes tempos hipermodernos, a cultura transformou-se num mundo cuja circunferência passou a estar em todo o lado e o centro em lado nenhum”. (LIPOVETSKY, et al., 2010 p. 12). “A mundialização coloca uma outra questão à Europa da cultura – o que é que os outros países e continentes esperam da Europa no plano cultural – a América Latina, o Japão, a África, o Oriente em que há laços culturais, onde ainda se falam línguas europeias – o português, o espanhol, o francês?” (RIBEIRO, 2003 p. 317).
Featherstone chama à fragmentação cultural de “cultura de massa”, a cultura produzida e consumida pela sociedade de massa. Relaciona ele o surgimento da sociedade de massa com o aparecimento do capitalismo industrial que emergiu da Revolução Francesa e da Revolução Industrial. E que “é preciso prestar atenção às mediações entre a economia e a cultura, focalizando as actividades dos especialistas e intermediários da cultura e a expansão dos públicos (a geração do “baby-boom” do pós-guerra) de toda uma nova gama de bens culturais” (FEATHERSTONE, 1996). “À geração Baby Boomers, ou geração pós-guerra, (…) é-lhe atribuída grandes transformações da sociedade. Ela nasceu na era do optimismo, do progresso e das oportunidades.
(…) É conhecida por pertencer a uma geração de grande consumo. Foi nesta geração que se sentiu o consumo influenciado pelas marcas, e que as pessoas começavam a ter cuidado com a sua imagem; e com isso as empresas começaram a facturar. Esta geração nasceu na época quando o capitalismo se começou a «mostrar» e quando pela primeira vez se ouviu falar da globalização. Viveu a época do petróleo, da inflação, da comida rápida, do crédito ao consumo e dos cartões de crédito. Esta geração crê no progresso económico e social (LEMOS FIGUEIREDO, 2010).
“Capitalismo, o sistema económico fruto da Revolução Industrial e das subsequentes mudanças tecnológicas que provocaram um profundo impacto no tecido social. Os operários, oriundos de um sector agrário tradicionalista, adaptaram-se às «máquinas a vapor» e aos horários de trabalho que lhes consumia todo o tempo. Com a sequente modernização do sector produtivo, o trabalho teve que ser dividido, o que «transformou as pessoas em especialistas», segundo Benjamin. Mas também lhes regulamentou as suas vidas, que se reduzia ao quotidiano nas fábricas, o que lhes impossibilitou novas «experiências», para além da repetição e do controlo. A contestação surge. Não só a exploração inerente ao mundo do trabalho, mas também as regras disciplinares deste modelo de sociedade e a sua uniformidade, monótona e mecânica. O predomínio do aspecto quantitativo sobre o qualitativo, que domina o espírito capitalista, é totalmente rejeitado. Benjamin chama a este movimento a «metafísica do provocador». Sobretudo, é a revolta contra a cultura burguesa e as suas divisões do espaço e do tempo que nutre essa metafísica” (LEMOS FIGUEIREDO, 2011). “Pobres trabalhadores! Enganados e além do mais pisados! O trabalho é uma maldição, Saturno. Abaixo o trabalho que temos que fazer para ganhar a vida! Esse trabalho não nos honra, como dizem; só serve para encher a pança dos porcos que nos exploram. Em compensação, o que fazemos por prazer, por vocação, enobrece o homem. Seria preciso que todos pudéssemos trabalhar assim. Olhe para mim: não trabalho. Que me enforquem, não trabalho, e você vê, vivo mal, mas vivo sem trabalhar” (BRUNEL, 1983).
“A Modernidade expunha algumas divisões na disposição do seu espaço, isto é, já era notada alguma separação entre «espaço público» e «espaço privado», entre «trabalho» e «lazer», entre «prosaico» e «estético», como se não fosse suficiente a separação entre «espaço secular» e “espaço sagrado” já existente há muito” (LEMOS FIGUEIREDO, 2011). As «massas» começam a ter o desejo de possuir o objecto, de ter uma maior proximidade com ele. E assiste-se a um optimismo exaltado sobre a «cultura de massas», considerando que as inovações na reprodução técnica da arte seriam suficientes por si só para revolucionar a produção artística. Aparece um novo mercado que ganha grande desenvolvimento com as indústrias do entretenimento e do lazer, que basicamente se baseiam no princípio da satisfação de certas afecções das massas (galerias, exposições mundiais, panoramas, cinema, etc) e que seria fortemente influenciado pelos meios de comunicação (impressos e electrónicos). Estava percebido o conceito de «kitsch», e com isso a arte tinha ganho um estatuto democrático. Benjamin pensa que para além de revolucionar a produção artística, este novo mercado seria capaz de igualmente revolucionar as estruturas sociais, visto que, o cinema poderia ser um enleio para a consciência revolucionária e servir o proletariado que se preparava para ascender ao poder. “Aproximar de si as coisas, espacial e humanamente, representa tanto um desejo apaixonado das massas do presente como a sua tendência para ultrapassar a existência única de cada situação através da recepção da sua reprodução” (BENJAMIN, 1972 p. 213).
Clement Greenberg tem uma posição deveras crítica em relação ao «efeito kitsch» na sociedade de consumo. Chega a defender a existência de uma «alta cultura», as artes vanguardistas, e de uma «baixa cultura», os produtos comerciais «kitsch», onde explica estas duas «culturas» nas dicotomias alta cultura/baixa cultura, vanguarda/kitsch, pergunta/resposta, causa/efeito, forma/conteúdo, ruptura/reconhecimento e cultura em movimento/cultura estática (GREENBERG, 1939).

Lisboa (Universidade Lusófona), 3 de Maio de 2011

TRABALHO COMPLETO

I – A Modernidade é um projeto da Revolução Industrial  – 

II- O Pós-modernismo é uma nova etapa do Capitalismo 

III – A Idade Moderna chegou ao fim e está aí a Idade Global  

IV – O Clube Bilderberg, um Governo Mundial Único

V – Os Descobrimentos Portugueses foram a primeira Globalização Moderna 

VI – O posicionamento da Cultura na Hipermodernidade –  VOCÊ ESTÁ AQUI

VII – A Cultura do consumismo na pós-modernidade  –

VIII – A passagem da «escrita» para a «imagem» na Pós-modernidade  –

IX – A Hipermodernidade, o pós-humano e a chegada do Cyborg   – 

X- A Modernidade é a industrialização da guerra  –

XI -Bibliografia

Hernâni de Lemos Figueiredo
©Hernâni de Lemos Figueiredo (2013)

Programador Cultural

hernani.figueiredo@sapo.pt

965 523 785

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