“história(s)” de Olga de Soto na CulturGest

“história(s)” de Olga de Soto na CulturGest

05/10/2011 0 Por hernanifigueiredo

A “história(s)” de Olga de Soto é uma coreografia curiosa inspirada no bailado “Le Jeunne Homme et la Mort”, de Jean Cocteau, uma obra de referência da história da dança que se estreou em Paris, no “Théâtre des Champs-Elysées”, no já longínquo dia 25 de junho de 1946. A “história (s)” de Olga de Soto é uma coreografia onde os espetadores da sessão inaugural, há mais de 60 anos!…, são os protagonistas; todos na casa dos oitenta e muitos anos. Foram entrevistados e todos trouxeram depoimentos sobre as suas recordações marcantes do o espectáculo.

Este convite a Olga de Soto insere-se num projeto da Culturgest de homenagear todos os anos um artista diferente. “Que proposta estranha! Porquê eu?” Questionou-se a coreógrafa. “Uma homenagem? Como prestar homenagem a este espetáculo que realmente nunca vi?” De “Le Jeunne Homme et la Mort”, o que Olga se lembrava, era tão somente algumas imagens vagas de um filme a preto e branco, dos movimentos pungentes de Jean Babilée, “um bailarino extraordinário”, e do seu rosto sombrio, contraído, ferido, “com uma expressão exagerada”. Igualmente tinha a recordação vaga de um homem que se enforca e de uma mulher com uma máscara horrível de morte. “As sacudidelas das pernas, dos pés, dos braços, do corpo suspenso do enforcado”.
Após a coreografia, houve lugar para uma conversa informal com Olga de Soto na Sala 1 da Culturgest. Num surpreendente e fluido português (Olga de Soto é espanhola e reside na Bélgica), a coreógrafa permitiu-nos conhecer melhor os “bastidores” deste espetáculo.

Onde encontrar as pessoas, que não conhecia, que tinham assistido, há 60 anos, à estreia? Grande desafio para Olga de Soto. Tanto maior porque tinha estabelecido a meta de só falar com “espetadores verdadeiros”, pessoas que não fizessem parte do círculo artístico da época, simples anónimos que tivessem assistido à estreia. Quem a poderia ajudar? Jean Cocteau, responsável pelo libreto, morreu em 1963. Georges Wakhevitch morreu em 1984. Boris Kochno, na altura diretor do Ballets des Champs Elysées, morreu em 1990. Rolant Petit, o coreógrafo, e a bailarina Nathalie Philippart mostravam-se impossíveis de encontrar. A única pessoa que conseguiu localizar, e falar, foi o bailarino Jean Babilée.

Depois de um anúncio no jornal “Le Figaro” à “procura de espetadores que tenham assistido à estreia de Le Jeune Homme e la Mort, no Théâtre des Champs Elysées, em junho de 1946”, Olga de Soto recebeu alguns contactos, poucos. Todos os que viriam a constituir a sua verdadeira equipa de protagonistas da coreografia. São nove. Nenhum ficou excluído, nenhum outro foi acrescentado à equipa.

Olga de Soto pensava neste púbico da estreia de “Le Jeune Homme e la Mort”, em 1946, nas memórias que ainda poderia ter, no que teria guardado do argumento, dos intérpretes, da coreografia e do cenário. O que poderia restar de tudo isto nas memórias de de cada um? É que na altura eram jovens, alguns mesmo muito jovens. Hoje têm idade muito avançada e têm rugas.

Começaram as entrevistas, filmadas, com a recolha de testemunhos comoventes. Mas “a memória é subjetiva”, diz de Soto; “tem os seus buracos de esquecimento e as suas lombas límpidas, os seus acidentes, as suas hesitações mas também, por vezes, recursos extraordinários escondidos”. “histoire(s)” dá a ouvir vozes e narrativas que o tempo fraturou. Le Jeune Homme et la Mort está neles, acompanhou-os durante boa parte do caminho”, conclui Olga de Soto. E esta recolha permitiu a Olga de Soto uma montagem fílmica, como uma coreografia em que os materiais principais são as palavras, as intenções e as entoações.

Um espetacular jogo de iluminação a incidir nos diversos ecrãs, criteriosamente distribuídos pelo palco, e a música de Johann Sebastian Bach, como na estreia de 1946, emolduraram a “histoire(s) de Olga de Soto”, uma vídeo-coreografia de projeções das recolhas efetuadas, onde a própria coreógrafa é interprete, juntamente com Cyril Accorsi. Este projeto foi estreado em maio de 2004, no Kunstenfestivaldesarts, em Bruxelas. Desde então, tem circulado por toda a Europa com enorme sucesso.

5/outubro/2011



Hernâni de Lemos Figueiredo
©Hernâni de Lemos Figueiredo (2011)

Programador Cultural

hernani.figueiredo@sapo.pt


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