João Paulo II: revolucionário ou conservador?

João Paulo II: revolucionário ou conservador?

01/06/2000 0 Por hernani

Revolucionário ou conservador?

JOÃO PAULO II

 Surpreendeu o mundo ao assumir as culpas da Igreja pelos pecados e erros ao longo de dois mil anos, mais precisamente “pelas cruzadas e pela época da Inquisição”, “pela atitude para com os judeus e povos da Bíblia”, “pela época das colonizações” e “pela divisão entre cristãos e hostilidade contra outras religiões”

João Paulo II: conservador ou revolucionário? Jornal D'Alenquer (2000)

João Paulo II: revolucionário ou conservador?

No dia 16 de Outubro de 1978 o mundo recebeu a notícia de que um polaco, ex-operário, tinha sido eleito Papa, sucedendo a João Paulo I, que por 33 dias apenas, dirigira a Igreja. Era o primeiro Papa polaco da história da Igreja, o primeiro não italiano desde 1522 e o mais jovem (58 anos) desde 1846.
O novo Papa nascera a 18 de Maio de 1920 em Wadovice, a 30 Km de Cracóvia, considerada a capital religiosa da Polónia. Recebera no baptismo o nome de Karol (Carlos) Joseph Woytyla e fora ordenado presbítero em 1 de Novembro de 1946. O Papa João XXIII elegera-o Bispo Auxiliar de Cracóvia em 4 de Julho de 1958, tendo sido integrado em 28 de Setembro do mesmo ano. Em 13 de Janeiro de 1964, o Papa Paulo VI fê-lo Arcebispo de Cracóvia, conferindo-lhe o cardinalato. No Conclave do mês de Outubro de 1978, fora eleito Papa escolhendo para si o nome de João Paulo II, sendo o 264º na ordem de sucessão do Apóstolo Pedro como Bispo de Roma e Pastor de toda a Igreja Católica.
João Paulo II caracteriza-se como pessoa de intensa oração e de grande actividade e em 22 anos de pontificado, não se cansou de alertar contra a ganância e a miséria. Visitou cerca de 140 países, reunindo milhões de pessoas em torno de si. Elegeu a maioria dos Cardeais e dos 4.400 Bispos de toda a Igreja. Escreveu 13 Encíclicas, várias Exortações Pós-Sinodais e inúmeras Mensagens. Beatificou mais de 777 servos de Deus canonizando cerca de 300 Beatos
No dia 13 de Maio de 1981, em plena Praça de São Pedro, no Vaticano, o Sumo Pontífice foi ferido com gravidade num atentado praticado pelo turco Ali Agca. Atribuiu a sua salvação a Nossa Senhora de Fátima e, quando em 13 de Maio de 1982, em peregrinação de agradecimento, deslocou-se a Portugal, Juan Maria Fernandez Krohn, tradicionalista na religião, ultradireitista na política, um padre espanhol conotado com um grupo fundamentalista católico e que se considera “filho espiritual” de Frei Jerónimo Savonarola (1452-1498), ultra-ortodoxo, que foi queimado por heresia, atentou contra a sua vida, empunhando uma faca e gritando “morte ao Papa“, “abaixo o Vaticano II”,viva o cristianismo“, “abaixo o comunismo“. A 13 de Maio de 1991, deslocou-se novamente a Fátima, desta vez para agradecer a conversão da Rússia. Este ano foi a terceira vez que João Paulo II veio a Fátima, agora para beatificar “Jacinta” e “Francisco” e para desvendar o “terceiro segredo” de Fátima, profecia de que afinal, ele próprio era parte activa.
João Paulo II é uma daquelas personalidades imponentes e corajosas, mesmo sofrendo estes atentados, prosseguiu o seu trabalho de evangelizador e orientador da Igreja. “É preciso anunciar o Evangelho com a vida, somente assim se pode transformar a sociedade e o mundo. O Reino de Deus age a partir do interior, como o fermento na massa”. Questionou se, após o fracasso do comunismo, o capitalismo poderia ser considerado um sistema social vitorioso e a “meta dos países que agora se esforçam para reconstruir sua economia e sociedade”. Ele próprio respondeu que, “se por `capitalismo’ se entendesse um sistema no qual a liberdade do mercado não ficasse circunscrita a um sólido arcaboiço jurídico que o colocasse ao serviço da liberdade humana na sua totalidade…, então a resposta seria não” e concluiu que, embora “a solução marxista tenha fracassado, os factos concretos da marginalização e da exploração permanecem no mundo”. Surpreendeu esse mesmo mundo ao assumir as culpas da igreja pelos pecados e erros ao longo de dois mil anos, mais precisamente  “pelas cruzadas e pela época da Inquisição”, “pela atitude para com os judeus e povos da Bíblia”, “pela época das colonizações” e “pela divisão entre cristãos e hostilidade contra outras religiões”.
João Paulo II também contempla o “adormecimento” da Igreja, resultante, dizem alguns, da sua inflexível oposição a toda forma de controlo da natalidade e também do seu conservadorismo teológico. Desde a eleição de João Paulo II em 1978, a Igreja retraiu-se. Correspondia a 17,8% da população mundial e baixou para 17,4%, embora o número de católicos baptizados aumentasse de 750 milhões para os 990 milhões actuais. Há quem defenda de que “o que mais prejudica a Igreja é a incapacidade de acompanhar o crescimento demográfico mundial: milhões de católicos nas Américas e na Europa convertem-se às várias formas de protestantismo”.
João Paulo II tem advertido permanentemente contra o “consumismo destrutivo”, que ele considera parte da propagação da “cultura da morte” no mundo, ao lado das drogas, do álcool, da criminalidade e do aborto. As violentas críticas que faz ao aborto correspondem à sua posição ética e moral sobre a santidade da vida – questão que aprofunda cada vez mais as divisões dentro da Igreja.
Uma década atrás, depois do império soviético ter entrado na sua fase final de desmoronamento, o Pontífice advertiu em tom profético que o “capitalismo desenfreado” não será melhor que o “marxismo selvagem”, pois aprofundará ainda mais o fosso entre os ricos e os pobres. Hoje o Santo Padre vê a sua previsão concretizar-se com a crise espalhada pela Ásia, América Latina, Rússia e Leste Europeu. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, um bilião de pessoas, um terço da mão-de-obra activa do mundo, estão desempregadas.
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Hernâni de Lemos Figueiredo
©Hernâni de Lemos Figueiredo (2000)

diretor do Jornal D’Alenquer

in Jornal D’Alenquer de 1 de Junho de 2000, p. 3 (Editorial)

hernani.figueiredo@sapo.pt

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